Bibliotecas de Babel
Elas não precisam ser literalmente infinitas, como no conto do argentino Jorge Luis Borges, mas podem representar uma multiplicidade de conhecimentos e de agradáveis sentimentos.
Isto é um sonho — e você não vai querer acordar. Você está sentado em uma poltrona daquelas que abraçam o corpo todo, no total silêncio. A luz é difusa, suave, mas correta. Em suas mãos está seu livro preferido, e atrás, dispostos numa bela estante, todos os outros títulos que você ama. Ao seu lado, uma caneca de chá ou café quente. Você tem o dia todo para relaxar…
Não há quem não sonhe com momentos assim, assim como não há quem não traga bem no fundo da alma algum tipo de relação de encantamento com os livros e suas moradas: as bibliotecas.

Se os livros realmente fazem parte da memória afetiva das pessoas, é natural que o espaço criado para guardá-los, expô-los ou saboreá-los seja idealizado por quem está diretamente conectado a eles. Talvez mais do que qualquer outro ambiente de uma casa, o estilo de uma biblioteca será definido por seu dono, por seus gostos, experiências e vivências. Entrar ali precisa ser como entrar em uma cápsula mágica, que viaja para qualquer lugar e em qualquer tempo e que também pode representar um mergulho para dentro de si mesmo, a depender do que se lê.
De certa forma, esses ambientes planejados ajudam a contar as histórias. Não têm o poder de modificar os enredos nem os diálogos, é verdade, mas mudam o que sentimos em relação à experiência da leitura. Móveis, materiais, iluminação, cores, disposição dos volumes, tudo pode ser planejado para que a biblioteca brilhe feito protagonista, mesmo que não ocupe um cômodo exclusivamente seu na casa.
A biblioteca pode simplesmente dividir ambientes ou ser montada em algum canto antes desprezado e que se torna precioso automaticamente. O importante é criar um espaço confortável, que traga tranquilidade para relaxar e curtir uma boa leitura.

Há quem considere a biblioteca só mais um cômodo da casa, aquele em que os velhos livros quase nunca tocados são deixados. E há quem, literalmente, viva dentro de uma delas. O arquiteto Thiago Borges Mendes, natural de Florianópolis e radicado em Joinville, se encaixa como luva na segunda opção. Não só pela quantidade de volumes que guarda em seu apartamento — são cerca de 1.500 livros, espalhados por três cômodos — mas também pela assiduidade na leitura. A rotina é puxada. Thiago costuma dedicar boa parte da manhã aos jornais e, à noite, entra de corpo e alma nos livros. E confessa: por muitas vezes, a viagem vai bem além do que o relógio permitiria.
Com essa dedicação toda, daria pra cravar que o arquiteto lê de tudo um pouco, mas ele também tem suas preferências. Elas vão de Albert Camus, o filósofo e romancista franco-argelino autor de “A peste” a Michel de Montaigne, filósofo e humanista francês do século XVI, passando pelos autores do estoicismo, uma corrente que floresceu na Grécia e posteriormente foi levada a Roma, que preconizava o cultivo da temperança frente à dor e aos problemas da vida.

Com essa dedicação toda, daria pra cravar que o arquiteto lê de tudo um pouco, mas ele também tem suas preferências. Elas vão de Albert Camus, o filósofo e romancista franco-argelino autor de “A peste” a Michel de Montaigne, filósofo e humanista francês do século XVI, passando pelos autores do estoicismo, uma corrente que floresceu na Grécia e posteriormente foi levada a Roma, que preconizava o cultivo da temperança frente à dor e aos problemas da vida.
Profissionalmente, Thiago encara a elaboração de projetos de bibliotecas como um grande desafio, ávido por possibilitar que elas assumam a relevância de qualquer outro tema em um projeto. “As bibliotecas são tratadas por nós como oportunidades para provocações. De modo que abandonar experiências passadas é necessário em certa medida. E isto nos faz retomar um começo quase sempre simples, mas difícil, justamente por esse abandono”. Quando perguntado sobre qual o aspecto mais importante ao se projetar uma biblioteca, é rápido e conciso na resposta: “longe da janela, sempre”. E a sua biblioteca, Thiago, é muito diferente daquelas projetadas para seus clientes? — Sim, bastante. Uma parte dela fica ao lado da janela.

Bibliotecas não precisam necessariamente de um cômodo só para si. Aqui, os arquitetos da 0e1 aproveitaram um canto existente na entrada de um dos dormitórios, que também funciona como home office, para alocar esta estante. O desejo era mudar o caráter daquele espaço antes inutilizado, transformando-o na continuação do ambiente de trabalho, que ficou mais amplo e confortável. Destaque aqui para a utilização de plantas, menos comum em bibliotecas, mas que conferem leveza ao espaço. É preciso garantir que as espécies escolhidas estejam posicionadas de forma a garantir seu crescimento e plenitude, com cuidado especial para a incidência de luz.

Especialmente para aqueles que costumam passar várias horas por semana na companhia de livros, é importante que se tenha acesso fácil aos títulos, como na robusta moldura em gesso que acompanha todo o desenho do móvel e compensa a altura do pé-direito. Desta forma, os volumes localizados na prateleira mais alta acabam ficando ao alcance das mãos, sem a necessidade de usar uma escada.

escrivaninha ou ao lado da mesinha de apoio. Foto: Fábio Jr. Severo
Ao projetar uma biblioteca, sempre é necessário pensar no peso dos livros. O móvel leva estruturação especial. Nesse sentido, a espessura das prateleiras e a modulação dos perfis verticais que compõem a biblioteca não podem ser muito espaçados para suportar o peso dos objetos.

Os profissionais da Casa Sobrado tinham um grande desafio na elaboração desta biblioteca: precisavam organizar um enorme e diversificado acervo, que ia de clássicos da literatura a livros de viagens realizadas pelo casal de proprietários. O plano era revisitar o estilo clássico, sem perder a oportunidade de deixar o ambiente com um toque atual. Por isso, o rebuscamento comum do clássico deu lugar a linhas mais sóbrias e cores suaves. Destaque para o trabalho de marcenaria decorativa e para as prateleiras em lâmina natural de carvalho americano acetinado.

Não existe tamanho padrão para uma biblioteca. Tudo depende do espaço disponível, do acervo, das características do projeto e das aspirações do proprietário. A estante K7 — criada pelo arquiteto André Gurgel e inspirada nas antigas fitas cassete — ocupa quase toda a extensão da parede da nova loja da Mula Preta e foi desenvolvida especialmente para abrigar títulos premiados da editora alemã Taschen.

A estrutura, fixada diretamente na parede, é totalmente configurável, com prateleiras em MDF e estrutura de pilares em aço carbono. A iluminação aqui também foi planejada com muito cuidado. Os livros recebem iluminação direta para facilitar a identificação dos títulos. Abajures e luminárias foram espalhados pelo salão, e pontos de luz foram estrategicamente posicionados para criar um ambiente próprio para a leitura.

Em geral, as prateleiras permitem um melhor aproveitamento da área útil e são ótimas aliadas para quando se tem um acervo muito grande de obras em ambientes não tão amplos. Além disso, conferem ao espaço um aspecto de linearidade e simetria. Os nichos, por sua vez, podem ser utilizados de forma individual ou sequencial, em composições de tamanhos e cores diferentes, com variações de volume e materiais empregados. São também muito versáteis e de fácil instalação, podendo se encaixar em qualquer lugar.

Em seus projetos, o arquiteto Marcelo Salum costuma levar em conta os livros já pertencentes ao proprietário e misturá-los a objetos de decoração.

Como os livros já possuem variações enormes de modelos, tamanhos e cores, o ideal é apostar numa paleta neutra para a estante, em tons de branco, cinza, marrom ou preto, e deixar que o conjunto das obras seja o protagonista da história.
Até um sofá pode fazer parte das necessidades dos proprietários e ganhar destaque no ambiente. Aqui as luminárias são móveis e propiciam mais ou menos incidência de luz, para momentos de leitura ou relaxamento. Foto: Phillipe Arruda
Por isso, a forma de dispor os livros nas prateleiras precisa ser planejada com atenção e delicadeza, alternando verticalidade e horizontalidade sem comprometer o aspecto de organização das obras, que podem estar divididas por gêneros, autores ou em ordem alfabética, facilitando a busca. Combinar tudo isso com objetos decorativos, como pesos e aparadores de livros, contribui para que o espaço fique ainda mais aconchegante.


O desafio dos profissionais da Oka Arquitetura era reambientar uma biblioteca com móveis já existentes, em um cômodo em que a luz natural tem papel de destaque. O ambiente ainda fica anexo a uma sala de estar que está na visão de quem entra no imóvel. Os livros foram divididos por cores e dispostos de forma aleatória no que diz respeito aos tamanhos. A iluminação artificial foi concentrada no espaço de leitura, para oferecer maior conforto aos moradores, amantes da leitura. Assim, a estante colorida pelas lombadas dos livros se transformou em ponto de destaque na decoração da área social do apartamento.

Este é o estúdio de um colecionador voraz, idealizado pelo escritório Villiatti & Tomasi Patrão Arquitetura. O principal desejo do cliente era ter espaço de sobra para receber adequadamente um acervo de LPs, DVDs, CDs, livros e Toy Art em constante expansão. Na parte mais baixa das estantes foram criados gavetões que facilitam a organização geral e o acesso a algumas obras.

Os brinquedos ganharam um abrigo especial, com portas de vidro e prateleiras reforçadas. Alguns quadros e poucos objetos de decoração ajudam o ambiente a ficar ainda mais aconchegante, sem competir com a textura e o colorido natural trazidos pelos livros e discos da coleção.

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